Ei-los que partem, mais de 100 mil portugueses no último ano, disse o Secretário de Estado das Comunidades, de um governo que os impeliu a deixar o país que diz governar.
Perante a realidade de esvaziamento e envelhecimento do país, Pedro diz que não disse o que disse, ou disseram por si. Diz ainda que sobre a emigração e os que emigram não deverá cair um estigma. Com estas declarações feitas em França, e bem vaiadas, Pedro, tenta desresponsabilizar-se, passando para outros, os emigrantes, a responsabilidade da incerteza e da sorte. Sabe bem que esses 100 mil não estarão nas manifestações que encontrará pela frente. Sabe que a estes outros se seguirão. Sabe que o seu poder, apenas será aceite pelo vazio que vai ficando.
No Portugal de vários tempos, muitos foram os portugueses que partiram. Não é um fenómeno novo. Contudo, duvido que antes de Pedro, um outro governo tenha ousado impelir essas gerações de portugueses. Fazê-lo torna Pedro e os seus, indignos perante a comunidade de onde saíram e juraram servir e honrar.
«Este vaise i aquel vaise,
E todos, todos se van,
Galicia, sin homes quedas
Que te poidan traballar.
Tés, en cambio, orfos e orfas
E campos de soledad,
E nais que non teñen fillos
E fillos que non tén pais.
E tés corazons que sufren
Longas ausencias mortás,
Viúvas de vivos e mortos
Que ninguén consolará.»
¡Pra a Habana!, Follas Novas, Rosalía de Castro, 1880.
«O povo que fala pela voz de Aquilino Ribeiro é a única expressão válida de um país que continua a existir sob o chicote do invasor, que outro nome não merece o bando de aventureiros que implantou em Portugal o reinado do terror, dando-se como representante das virtudes que nunca praticou para 'salvar' Portugal de males de que nunca sofreu»
Adolfo Casais Monteiro no prefácio de «Quando os lobos julgam a Justiça uiva», publicado em São Paulo, Brasil, e que contém o texto integral da acusação e defesa no Processo de Aquilino Ribeiro pela publicação de «Quando os lobos uivam»
Ainda há Questões em Portugal. Grandes Questões. A discussão em torno da importância dos baldios no nosso país é ainda uma questão que o Estado Novo tentou apagar e que a Democracia, com o seu centralismo indiferente à realidade praeter Lisboa, pura e simplesmente ignorou e votou ao esquecimento.
É minha profunda convicção que o Estado, enquanto autoridade e corpo institucional de exercício de poder, só chega à interioridade rural portuguesa muito tardiamente, talvez mesmo apenas com o Estado Novo, já que até aí assistiamos a regimes (sobretudo no Minho interior, Trás-os-Montes e nas Beiras) comunitários regidos pelo chamado direito das gentes, muitas vezes profundamente democráticos e participativos. Assim, a existência de ditos populares como 'para lá do Marão mandam os que lá estão' não reflecte senão um sistema de organização autónomo de uma autarcia extrema. Isto acontecia não apenas porque o caminho fazia-se longo desde Lisboa mas também, e sobretudo, porque pura e simplesmente, a ligação das pessoas à terra e o seu sentimento de pertença à comunidade próxima ultrapassava largamente qualquer sentimento de 'portugalidade' que nenhum Portugal dos Pequeninos vergaria, à excepção de algumas elites citadinas que olhavam para o modo de vida de um habitante de Tourém com a mesma curiosidade que os primeiros naturalistas franceses olhavam para os índios pataxó: uma curiosidade museológica. Ainda é muitas vezes assim, embora o Estado Novo e a Democracia tenham efectivamente, para o bem e para o mal, conseguido destruir muitas das salutares diferenças entre um minhoto de Castro Laboreiro e um algarvio de Tavira.
As estradas são exercícios de demonstração pura de poder e autoridade. Quando é Lisboa que decide a construcção de uma estrada que liga Braga a Chaves o que o Lisboa está a fazer é a querer transportar-se para Chaves e, a partir de Chaves, para as aldeias e povoações circundantes. É inegável que foi isso que levou também a saúde, a educação e aquilo que acredito ser uma Justiça equilibrada e válida que, com os seus defeitos, vai garantindo o cumprimento de concepções moralmente aceitáveis de Justiça. Não pode ser considerado uma colonização porque o panorama é nacional e cabe ao Estado cumprir com o seu dever. Acaba aqui. O Estado colonizou quando avançou com o plano nacional de barragens e afogou dezenas de localidades expropriando, destruindo e perseguindo quem se opunha à chamada 'modernização do país'. É uma história que está por escrever. Vilarinho das Furnas tem a sua escrita pela mão de Jorge Dias num livro profundamente essencial para a compreensão não só do modo de vida das aldeias comunitárias em Portugal mas o que representou a sua destruição (Vilarinho das Furnas, uma aldeia comunitária, Jorge Dias, 1984, INCM).
«Quando os lobos uivam» retrata a história da expropriação dos terrenos baldios na Serra dos Milhafres, nas Beiras, e dos processos e caçadas ao homem que o Estado moveu contra todos aqueles que ousaram pronunciar-se contra o roubo e o esbulho do que já era, verdadeiramente, de todos. Mas o esbulho continua em democracia. Vilar da Veiga, antiga e muito rica aldeia comunitária de Terras de Bouro, sofreu duplamente. Primeiro, a partir de 1946 com o Decreto-Lei que regulava a arborização nacional, inicia-se o processo de expropriação dos terrenos baldios e os confrontos entre a população e os recém criados Serviços Florestais com a Guarda Nacional Republicana a ajudar na coronhada. Depois, em 1955, com a construcção da barragem da Caniçada e consequente desaparecimento da antiquíssima aldeia, as suas pontes, o seu casario granítico, uma das maiores veigas de Entre Douro e Minho e o belo ponto de junção do Rio Gerês com o Rio Cávado. Hoje o lugar é lindo com o seu lençol de água, mas antes era ainda mais. As pessoas foram assim arrastadas para as margens da albufeira e recomeçaram a sua vida como o Estado ordenou. Hoje em dia continuam a existir baldios, mas uma fatia muito grande do que representa o rendimento que os compartes retiram dos baldios é obrigatoriamente entregue a Lisboa, ao Instituto de Conservação de Natureza, isto por estarem os terrenos baldios localizados em pleno Parque Nacional da Peneda-Gerês. É roubo e esbulho.
Hoje em dia as nossas serras ainda têm lobos, mas menos, muito menos. Durante largas dezenas de anos organizaram-se caçadas em Lisboa aos lobos das nossas terras. No fim do Século XIX, em Covide, Terras de Bouro, uma Viscondessa de Lisboa financiou a construcção de um fojo para lobos. A contrapartida: as peles de todos os animais mortos. A nossa pele.
Primeiro descobriu-se que afinal Artur Batista (com p) da Silva na era consultor da ONU, mais propriamente do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), depois de duas mãos cheias de entrevistas, debates e conferências até bem interessantes, tendo austeridade como tema. Artur Baptista da Silva defendia que a austeridade não permite o crescimento económico e encaminha a população de uma dada comunidade para a pobreza.
Agora, soube-se através do jornal El Mundo que do lado de lá da fronteira, o espanhol Carlos Mulas Granados, participante no célebre Relatório do FMI, encomendado – literalmente -, pelo Governo de Vítor/Pedro/Paulo/Miguel (não sei bem qual é a ordem), talvez inspirado na obra de Fernando Pessoa, criou um pseudónimo – ou heterónimo, tornando Amy Martin uma extensão de si. Através dele, defendia em artigos, políticas orçamentais expansionistas como instrumentos de combate as crises financeiras, opostas à austeridade, que vem sendo aprofundada daquele e deste lado da fronteira.
Descoberto por uma mentira que obrigou o Ministério dos Negócios Estrangeiros de Paulo (só Paulo poderia descobrir uma história assim) a apurar se era mesmo verdade que o Brasil estaria disponível para comprar dívida portuguesa, dias a fio, Artur Baptista da Silva, proporcionou notícias cheias de incredulidades. Como conseguiu enganar tanta gente e tão experimentada!?
Não é que a defesa em artigos, conferências e debates por Artur Baptista da Silva, e diga-se, também Carlos Mulas Granados, de menos austeridade e propostas para o crescimento económicos fazia mesmo sentido!?
Estavam ainda os ânimos em 2012 e as mentes no exórdio do novo ano quando surgiu na imprensa, de forma tímida, a novidade de uma regra de ouro forçosamente aprovada em Conselho de Ministros e aplicada na Lei de Enquadramento Orçamental. Para os mais atentos a medida segue apenas a lógica das vigas de barro da construção europeia; para os mais incautos, a notícia perdeu-se entre os fait-divers e o tittytainment mediático. O nosso país está de agora em diante obrigado a cumprir um défice estrutural de 0,5% e impelido a não superar o tecto de 60% da dívida pública, caso contrário pagará uma multa sancionatória de valor igual a 0,1% do PIB. Foi dado o tiro de partida para a austeridade eterna. A Europa sairá incólume?
No fundo, é de conhecimento geral que a União Europeia se encontra numa espiral suicida. A sua patologia depressiva tem sido remediada com sobredoses paridas de um receituário com intenções dúbias. A própria lógica de soluções económicas e financeiras parece por vezes indecifrável face à miserável condição em que se encontram os países alvo de intervenção externa. Nesta conjuntura que ameaça estruturalmente um projecto político de décadas não há lugar para ingenuidade. O desvendar de uma política traz sempre os verdadeiros beneficiados. Para encetar tal tarefa, uma análise dos desenvolvimentos recentes da construção europeia é-nos útil.
O BCE já anunciou a compra ilimitada de dívida pública. Um alívio no financiamento apenas destinado aos bons cumpridores do programa de assistência da Troika, aos alunos bem comportados de maçã ofertada ao professor. Até esse momento tinha apenas participado na injecção de dinheiro em bancos com dificuldades e facilitado o crédito a juros irrisórios, que muitos beneficiários aproveitaram para comprar dívida pública dos países onde se encontram sediados e a taxas elevadas. Já para não falar no fundo de doze mil milhões de euros destinados exclusivamente à banca privada. O destino dos países intervencionados está assim nas mãos sujas da Comissão Europeia, do Banco Central Europeu e do FMI. Qualquer solução europeia passa directa ou indirectamente pelo ideologicamente esquizofrénico labirinto dos cortes no Estado-social, privatizações a saldos, despedimentos e reduções salariais complementados com um aumento cego de impostos.
Não é destituído de sentido o facto do fundo europeu que constitui parte do empréstimo a países como Portugal, agora renomeado de Mecanismo de Estabilização Europeu, apenas financiar quem tiver ratificado o Tratado Orçamental Europeu. Garante o cumprimento de medidas que acarretam a transversalidade de economias depauperadas que competem externamente através de baixos salários e atraem investimento estrangeiro pela via das privatizações baratas de sectores estratégicos e naturalmente monopolísticos do Estado. Os bancos, esses têm garantida a sua recapitalização pelo MEE sem intermediação directa dos Estados após acordo sobre a Supervisão Bancária.
Deste modo, o anúncio da emissão de dívida portuguesa a cinco anos é apenas um manobra de diversão. O Portugal pós-troika que, segundo Passos Coelho, deve começar a ser alvo de reflexão com medidas de estímulo económico é uma mera fantasia. Uma fórmula política de manutenção no cargo. O futuro português é o seu presente. Cabe-nos romper com o passado recente e lutar contra a conjuntura troikista e a estrutura orçamental europeia.
Hoje Portugal ‘foi aos mercados’. A república Portuguesa conseguiu vender 2500 milhões de euros em dívida pública com uma taxa de juro de 4,891%. Isto são, indesmentivelmente, boas notícias. Não significam o fim da austeridade nem dos cortes brutais no nosso estado Social, não significam mudanças fundamentais para os cidadãos Portugueses que continuam com dificuldades, mas são boas notícias.
Com estas notícias o Governo (e respectivos apêndices parlamentares) reclamou vitória, falou do ‘colossal’ sucesso do nosso programa de ajustamento, do excelente trabalho do Governo e de quão perto estamos agora de conseguir ter o FMI ‘de aqui para fora’ e recuperar a nossa soberania (e de caminho o nosso orgulho ferido). Ora, na sua maioria, o sucesso desta operação depende pouco do Governo que a única coisa que tem para mostrar é uma consolidação orçamental incipiente, uma dívida pública nos 120% do PIB (notícia também de hoje, mas a que ninguém ligou nada, agora já não importa, os mercados parecem já não estar obcecados com a dívida pública) e uma brutal recessão que tornam a nossa solvência financeira cada vez mais uma miragem. O grande responsável é o BCE que se disponibiliza a comprar no mercado secundário (ou seja a quem nos comprou a dívida) a nossa dívida pública enquanto continuarmos a fazer o que eles dizem. Ou seja, o FMI pode sair do país que a austeridade está para durar. Ainda assim são boas notícias, é melhor do que não termos conseguido, mesmo nestas condições, colocar dívida pública nos mercados financeiros.
Portanto, apesar de tudo parece que o saldo do dia é positivo, do mal o menos.
Este era o raciocínio que eu tinha feito para mim mesmo quando fui jantar, acontece que enquanto eu jantava a senhora Secretária de Estado do Tesouro estava a dar uma entrevista e eu tive um daqueles momentos ‘diz-me, por favor, que estás a gozar’, já vos aconteceu de certeza. De forma simples, o que a Senhora Secretária de Estado do Tesouro disse foi que nós fizemos esta operação de financiamento de forma a dar um sinal claro de que éramos capazes e, perante a insistência do jornalista, ela explicou que não tínhamos necessidades de tesouraria ou de financiamento mas que ainda assim decidimos fazer esta operação.
Ou seja, se eu entendi bem o que a senhora disse, a república Portuguesa ‘foi aos mercados’ pedir um empréstimo, pelo qual vai pagar juros, de dinheiro de que não precisa com o único objectivo discernível de permitir ao Governo anunciar com pompa e circunstância que é capaz de o fazer. Para ser mais claro, o Estado, ou seja, todos nós, vai pagar um pouco mais de dez milhões de euros por mês em juros por dinheiro de que não precisa para que o Governo possa fazer um brilharete.
Tenho de conceder que, de facto, este é um dos golpes de marketing político mais eficazes que tenho visto, mas é também, seguramente, um dos mais caros.
Isto, meus amigos, não tem outro nome, é simplesmente a Twilight Zone…
Não sou, por princípio, desfavorável à nacionalização de uma entidade bancária. Recapitalizar a iniciativa privada? Esse é outro assunto.
A Comissão Europeia aprovou, hoje, a recapitalização do Banif com o objectivo e o argumento de assegurar a "estabilidade financeira" da instituição. Ao que parece, o Estado estará ausente da administração do banco, ao bom estilo filantrópico. Joaquín Almunia (aquele velho social-sindicalista resistente ao franquismo), Vice-Presidente da CE, referiu que "Portugal necessita urgentemente de elaborar um plano de reestruturação aprofundado", o que faz sentido à luz da ausência de administração que herdamos.
É demagogia barata vir falar-vos do BPN, caso "completamente diferente", como rugiu Luís Amado, destacado "socialista" da frente capitalista que nos governa. Vamos, então, fazer as contas à santa recapitalização do Banif: segundo dados do INE, a população activa em Portugal é, aproximadamente, de 5 milhões de pessoas. A injecção de capital no Banif será de 1100 milhões de euros. Ou seja, cada português activo, através dos seus impostos, pagará este ano cerca de 220 euros para este rancho sem que o nosso Governo, insigne negociador de tratados, determine, exija ou ordene coisa alguma.
Mas atentemos no discurso do Governo: aquele dos compromissos e sacrifícios. O Governo infligirá penalizações que, apesar de transversais (excluíndo a banca), são também arbitráreas, começando pelos despedimentos que propõe, finalizando na redução do valor de subsídio de desemprego. Tudo isto pela moralização do nosso Estado e dos nossos impostos. Em nome de um esforço nacional, numa missão "histórica e estóica", como Pedro liricamente sublinhou. A verdade é uma: os impostos dos trabalhadores são para alimentar vícios privados, salvaguardas de liquidez para determinadas empresas no mercado livre, que se rege pela concorrência.
Parece haver crianças sem refeições completas nas escolas e nas suas casas. Provavelmente, ainda ninguém avisou Pedro do sucedido. Governar é priorizar. Se o Banif sobreviver, podemos acusar o Governo Português de negligência perante a morte de quem tem fome?
Braga é uma cidade muito especial. Especial naquele sentido eufemistico que utilizamos para qualificar o que não é normal. É especial quando os seus cidadãos querem irigir uma estátua ao Cónego [Filho da Puta] Melo, é especial quando alunos são suspensos do Colégio Dom Diogo de Sousa por fazerem trabalhos festivos sobre o 25 de Abril, é especial quando o Domingos Névoa nela enriqueceu, é especial quando o poder espiritual se imiscui nos assuntos terrestres e é, enfim, especial, por costume e tradição.
A Polícia de Segurança Pública ter-se-á tornado hoje numa especialidade de Braga a par das barrigas de freira e das frigideiras.
É claro que há sempre a perspectiva contrária, segundo a qual os irrequietos miúdos bracarenses é que são especiais e, atendendo a esse aspecto, refere a Matriarca da Ordem Pública da cidade, a Comissária Ana Margarida, que o uso de gás pimenta para dispersar a canalha mais nova foi escolhido em vez de uma intervenção mais musculada. Ora bem! Não se bate nas crianças, quanto mais em crianças especiais! Consideramos assim esta uma intervenção baseada em profundos pressupostos éticos e morais, pelo que a Polícia de Segurança Pública de Braga não merece senão o nosso aplauso. Esta era a outra perspectiva, completamente idiota e idiotizante.
O GAEB, Grupo Armado dos Estudantes de Braga, célula militarizada dos alunos da Escola Alberto Sampaio, está prestes a libertar um comunicado, onde agendará novas formas de luta violenta para os próximos dias, onde se incluem vigilias nocturnas à porta da escola e uma manifestação silenciosa em frente do Governo Civil. Por esta hora reforços da PSP de todo o país dirigem-se para Braga.
Quando a realidade supera a ficção não sabemos se estamos a ler o jornal ou o suplemento humorístico.
(Por vezes importa discutir só a validade dos comportamentos e não apenas soluções para problemas concretos)
Tem sido afirmado, por uma certa historiografia cujo método interpretativo dos factos históricos é dúbio (talvez a historiografia do romance de cordel) que o povo português é um povo de brandos costumes. Que esses 'brandos costumes' são uma forma fatalista de conformação com as coisas. «É assim a vida!» ou «Vai-se andando» ou «O que importa é ter saúdinha», seriam assim frases costumeiras representativas desse maravilhoso ethos português que tanto jeito parece andar a dar agora. A ser assim reduziriamos os portugueses, enquanto entidade colectiva, a um conjunto de alienados mentais entregues ao choro e à lágrima. Não é uma imagem bonita.
A verdade é que pelo menos desde a última grande greve geral de 18 de Janeiro de 1934 que não há uma vaga de fundo que seja libertadora ou impositora de uma vontade colectiva. Seja ela qual for. A verdade é que estamos individualmente entregues aos nossos prazer pessoais, achamos que temos muito a perder. A consciência de classe continua a não estar disponível ao cidadão comum. Votar é já um esforço. Reclamar é uma obrigação. Mas fica por aqui.
Alguns perguntarão por que motivo não considero eu que essa última grande vaga de mudança aconteceu com o 25 de Abril de 1974. Porque o 25 de Abril não foi uma revolução popular. Foi um golpe de estado feito por alguns militares que depois convidaram os portugueses para uma grande sardinhada de dois anos. E convidaram-nos a todos! Inclusivamente os bufos, que a certa altura fugiram às dezenas de Alcoentre. Enfim, como havia moralidade, comeram todos!
Hoje continua a haver moralidade e boa vontade e pão e vinho e tranquilidade e respeitinho e saúdinha e se não for o Benfica é o Porto e o Sporting já voltou a ganhar e os estrangeiros já investem cá e os angolanos até nos estão a ajudar e isto não é o Biafra por isso por que nos queixamos? e este ano vamos crescer se não crescemos este crescemos para o próximo e somos um povo de respeito e de respeitinho. Somos sim senhor.
Interiormente continuamos com a mesma vontade de sempre em mudar as coisas. Publicamente admitimo-lo até, mas a coragem foge-nos pelas mãos como a água quando olhamos para o nosso tamanho. E no entando... (sorriso) qualquer decisão e opinião é profundamente política e, consequentemente, moral. No plano das ideias tudo está bem. Para quando tornarmos as decisões e as opiniões moralizadoras? É o momento em que a consciência obriga à acção. E a acção, como é bem sabido, tem muitos caminhos.