“Escrever 500 caracteres a partir de um currículo de 8000 mil, num espaço de tempo reduzidíssimo”… Assim se cavam buracos. Assim este governo justifica a omissão à passagem de Franquelim Alves pelo universo do BPN, no currículo do novo Secretário de Estado do Empreendedorismo, Competitividade e Inovação, e cava mais um buraco negro, sem explicação possível, nas ligações entre governos e interesses privados, que se verificaram ruinosos para o país e os contribuintes.
De facto passar pelo BPN, pode não constituir ilícito, apesar das dúvidas que surgem à sua actuação perante o conhecimento de ilícitos. Afinal não assinou cartas, que surgem como alegadas provas, e o idóneo Miguel assegura a idoneidade do senhor. Acresce ainda uma interrogação: o que tem de especial o currículo de Franquelim para ocupar as áreas a que está adstrito, e o distinga de outros que não estivessem ligados ao BPN, um dos maiores escândalos da democracia portuguesa, a aguardar nos tribunais uma conclusão.
O governo que promete o fim da impunidade com a sua chegada, apenas adensa a nebulosa em torno do BPN, nada explicando neste momento oportuno, sobre o andamento do processo, e se este dispõe de meios para conhecimento cabal da verdade, que continuará a levar milhões ao erário público e aos bolsos de todos os portugueses, por causa daqueles que realmente viveram acima das suas possibilidades.
É difícil aguardar com serenidade pelo uivo da justiça. Os anos vão passando, e mais alguns se esperam, para um processo de raízes insondáveis, com alicerces nas mais altas conivências, silêncios e omissões.
Sussurram-nos aos ouvidos que esta crise irá durar uma geração. Poderá esta afirmação significar que, os actuais dirigentes, desistiram do país? Que a União Europeia desistiu da Europa? Que viverei 50 anos neste estado de excepção política, como vulgarmente lhe chamam?
As respostas a estas questões são, provavelmente, mais assustadoras que o prefixo de as colocar. E é por esse motivo que aqui evoco a Internacional Socialista, que continua a provar ser um vazio ideológico, ao estilo Papandreu. Que reacção estão os socialistas dispostos a empenhar contra a indigência que assola o mundo? Aparentemente, nenhuma. É então que surge, no mais triste hotel de Cascais, em sala composta de democratas e ditadores, entre resistentes e servis, um contundente "Não!" a toda aquela espectacularidade. Beatriz Talegón, Secretária-Geral da IUSY, trouxe ao momento o equilíbrio intelectual necessário, perguntando aos presentes, senhorios do discurso socialista, se faz sentido a defesa de um modelo de desenvolvimento acente no exemplo luxuoso de uma organização criada para defender a classe baixa e os trabalhadores. "O problema é de representatividade política", acrescentou mais tarde. O Sul da Europa atravessa uma crise que promoveu, só em Portugal, 200 mil desempregados no último ano. Para minha tristeza, a Internacional está em estado avançado de inutilidade. Por este motivo, o discurso de Beatriz é também a urgência de um novo método para os partidos socialistas se fazerem respeitar. Falta gente como a Beatriz, com coragem para estalar a elegância destes eventos.
A Internacional está na rua, segundo Papandreu. "Junto das pessoas, na rua", sublinhou. Eu ainda não a vi. Por isso reitero: onde está a Internacional Socialista? Onde estão os estadistas da Internacional? Uma, pelo menos, consigo identificar. Obrigado Beatriz.
Ultimamente tornou-se hábito termos de justificar-nos longamente com argumentos de índole ideológica e depois económica e depois social e depois cultural e depois burocrática o porquê das coisas e o que nos leva a defender ou a rejeitar isto ou aquilo. Eu podia usar este primeiro parágrafo para discorrer sobre as virtudes do ensino público de qualidade, sobre a importância de uma escola secundária artística, como outra qualquer, possuir cantina e um pavilhão para as aulas de educação física, mas isso é absurdo, tremendo até. Em suma, uma tarefa hercúlea para alguém que, como eu, está macerado com a pancada que anda a levar.
Arroio? Mais parece um pântano!
A história do PREC e dos seus intervenientes ainda será reescrita. Persistem muitas contradições; elevam-se heróis que nunca o foram e são condenadas personalidades sem grande sensatez. Os olhares e os pensamentos não estão alheios à nossa ideologia.
Um exemplo desse mar envolto de paixões e ódios é Manuel Serra. Figura da luta anti-fascista da juventude operária católica, a memória colectiva não esquece o seu envolvimento nos golpes da Sé e de Beja contra o Salazarismo que lhe valeram, em surdina, ofensas físicas e psicológicas nos calabouços da PIDE.
Feita a revolução dos cravos, cria o Movimento Socialista Popular. Um grupo autónomo no seio do PS, cuja doutrina socialista democrática previa a prossecução da Constituição da República e do seu carácter programático sem cedências. Acaba por perder o II Congresso do Partido Socialista para Mário Soares e retira-se para iniciar em Janeiro de 1975 a Frente Socialista Popular. Os seus 44% de votos permitiam-lhe sonhar com uma dissidência massiva dos militantes socialistas que se reviam no seu carácter revolucionário. Tal não aconteceu, tendo se juntado a vários grupos de esquerda para formar a Frente de Unidade Revolucionária em apoio ao V Governo Provisório e, posteriormente, à operação do 25 de Novembro de 1975.
O seu passado de oposição ao partido no qual militou juntamente com a sua concórdia à esquerda denominada de radical ainda hoje ecoa nas mentes daqueles que o repugnam.
Eu prefiro desdizer esse maniqueísmo e interpretá-lo ao sabor da sua vida. Um homem incontornável da esquerda portuguesa que viveu como pensou; nunca pensou em como viver. E que falta fazem nestes tempos aqueles e aquelas que vivem apaixonadamente a coerência.
P.S: O falecimento de Manuel Serra deu-se no dia 31 de Janeiro de 2010. A minha memória pregou-me uma partida e não me recordei em tempo útil de escrever este texto. Ainda assim, lutadores como Manuel Serra não necessitam de pretexto para serem relembrados com todo o louvor.
O inefável Fernando Ulrich, funcionário oficial dos Governos nacionais e transnacionais para a política financeira, desceu do seu palacete intelectual para se comparar aos pobres deste rico país. A primeira pergunta que me ocorre é dirigida a Dante que, certamente, recorrerá a Virgílio para tão embaraçosa questão: há círculo na Divina Comédia para escaldar Ulrich, o Apparatchik?
Todos se lembram do ultimato colectivo em que participou Ulrich? Sim, aquele conjunto de entrevistas que assolaram a opinião pública durante uma semana. Aqueles homens, maiores concorrentes entre si na actividade bancária, pediram em uníssono a intervenção da Troika em Portugal. Ulrich optou por se destacar ao longo dos meses. Começando por abrir as portas do BPI à exploração de trabalhadores, rapidamente ameaçou o Estado de nova vaga nos centros de emprego. Defensor de desvalorizações salariais e de perigosos ajustamentos, Ulrich é a ventoinha de difusão de toda a porcaria que Passos, Portas, Gaspar e a Troika reproduzem. Esta superstrutura que nos governa, sociedade oficial segundo Marx, inverteu as prioridades do Estado Providência e posicionou-se em nome de interesses privados e corporativos. Adoptou um discurso reaccionário, tomou os órgãos decisórios de assalto e lançou um feudo confiscatório sob o país.
Os interesses de Ulrich, o Apparatchik, confundem-se com os da Troika e a banca agradece. Intermediário nas teses sociais do Governo, por falsa modéstia admite o acaso do infortúnio nestes tempos difíceis e quer ser confundido com um sem-abrigo. Sabe que o purgatório, a existir, é posterior à sua conduta profana e está disponível para se desculpar mais tarde por tamanha servidão ao capitalismo. Apela às massas e à sua mansuetude em nome da naturalidade e inevitabilidade da concentração de dinheiros públicos no seu negócio: doce mercado, livre do Estado e da lei, dependente dos nossos bolsos. Ulrich, o Apparatchik, criou o Oitavo Pecado Capital negligenciado por Dante: ser domesticado. Tragam as brasas.