No país de Passos Coelho foram criados 120 mil empregos. No outro país, o de pedra e terra, foram criados apenas cerca de 20 mil (sem contar com os destruídos).
De ressalvar a capacidade de Passos Coelho ver para lá das fronteiras do seu jardim à beira-mar plantado. Só contabilizando, em hipótese, os empregos que cerca de 100 mil portugueses tivessem encontrado ao emigrar, é que os seus números batiam certo. Um visionário, portanto.
No fundo, Nuno Crato, permanece o anterior maoista romântico e revolucionário de antigamente, a revolução é que parece ser outra, e passa pela desqualificação da escola pública, e de todos os métodos que não estejam enquadrados nos seus preconceitos mentais. No fundo, e freudianamente, será recalcamento pela sua passagem pela via maoista, mais seus métodos de implosão e terraplanagem, tão demodée nestes tempos neoliberais.
Mais, tal como o maoista de antigamente, também este "renovado" Crato, tenta demonstrar à força toda que a sua teoria é a correta. Pode ser publicado um estudo Pisa, pode ser ele o responsável último pela formação ministrada no ensino superior, podem contrapor os especialistas em ensino e pedagogia, que a sua teoria é que está correta. O método de conversão utilizado por Crato é, no fundo, o do verdadeiro facilitismo. Destruindo pura e simplesmente o modelo até agora existente, construirá um novo com o seu complexo sistema de preconceitos. Façam um exame a Crato e verão se está apto para ministro da Educação.
Outro dia, num jantar entre amigos discutiam-se alguns temas da atualidade. Da política, à resposta a alguns dos problemas do país, à invenção de uma medida que qualifique a designação de alguém na sua pertença à esquerda. No saudável uso do contraditório como método de debate, contrapôs-se entre os convivas, a triste sina, a inevitabilidade dos tempos e das soluções como contra-argumento, o fim da capacidade de sonhar, e esse duro muro inultrapassável para os jovens. O mundo está assim, ajustemo-nos. Se estivessemos com João Cabral de Melo Neto à mesa, este nos diria que é a "educação pela pedra", como no Sertão.
Recordando a conversa, apetece-me voltar a argumentar, desta feita com uma foto de agosto de 1975. Nela estão François Mitterand, Yitzak Rabin, Willy Brandt, Mário Soares, Olof Palme e Harold Wilson, reunidos pelos ideias e a ação, e são o exemplo da transformação das vontades em sonhos concretizados, pela via - imagine-se -, da política e da crença na alteração da condição de onde parte o Homem.
«Duvido de que toda a filosofia do mundo consiga suprimir a escravatura: o mais que poderá suceder é mudarem-lhe o nome. Sou capaz de imaginar formas de servidão piores que as nossas, por serem mais insidiosas: seja que consigam transformar os homens em máquinas estúpidas e satisfeitas, que se julgam livres quando estão subjugados, seja que desenvolvam neles, com exclusão dos repousos e prazeres humanos, um gosto do trabalho tão arrebatado como a paixão da guerra entre as raças bárbaras. Prefiro ainda a nossa escravidão de facto a esta servidão do espírito ou da imaginação. Seja como for, o horrível estado que põe o homem à mercê de um outro homem precisa de ser cuidadosamente regulado pela lei.»
In Memórias de Adriano, de Marguerite Yourcenar.
Este é o rascunho da Carta da Liberdade, escrito na parede da cela de espera do Palácio da Justiça de Pretória.
The Freedom Charter
Preamble:
South Africa belongs to all who live in ti, black and white and no government can justly claim authority unless it is based on the will of the people.
1. THE PEOPLE SHALL GOVERN!
2. ALL NATIONAL GROUPS SHALL HAVE EQUAL RIGHTS!
3. THE PEOPLE SHALL SHARE IN THE COUNTRY'S WEALTH!
4. THE LAND SHALL BE SHARED AMONG THOSE WHO WORK IT!
5. ALL SHALL BE EQUAL BEFORE THE LAW!
6. ALL SHALL ENJOY EQUAL HUMAN RIGHTS!
7. THERE SHALL BE WORK AND SECURITY!
8. THE DOORS OF LEARNING AND CULTURE SHALL BE OPENED!
9. THERE SHALL BE HOUSES, SECURITY AND COMFORT!
10. THERE SHALL BE PEACE AND FRIENDSHIP!
Nelson Mandela foi detido sumariamente e esperavam-no no tribunal 150 activistas do ANC. Acusados de traição pela concepção deste documento basilar do ANC, acabaram por ser libertados mediante pagamento de caução. Em Dezembro de 1955, um documento final seria aprovado pelo Congresso do Povo. Pode ser encontrado aqui.
Soubemos hoje que a Autoridade Tributária - logo Finanças, logo Governo - teve, desde 2012, acesso à informação de todos os pagamentos efetuados com todos os cartões de débito e crédito. Todos. Tendo em conta que é com eles que são feitos muitos dos atos do nosso dia-a-dia, o que comemos (se cruzarem com a respetiva fatura saberão o que comemos - sim, eles falam muito em liberdade e libertação dos cidadãos da esfera do Estado), bebemos, por onde andamos, alguém teve acesso a essa informação. Desta vez chamou-lhe combate à fraude e evasão fiscal, da próxima, depois de aberto o precedente, chamar-lhe-á outra coisa qualquer e redonda.
O Ministério da Verdade (homenagem a George Orwell) português não é o único, conforme tivemos conhecimento recentemente, o congénere Ministério da Verdade norte-americano espia um pouco por todo o mundo, contudo, o nosso combate à fraude e evasão fiscal não nos deve deixar descansandos, pelo contrário, salvo se for opção individual ter como companhia uma camarazinha de estimação.
Smile! They are watching you.
Duas religiões dão mostras do seu ortodoxismo no extremo ocidente europeu, este jardim à beira-mar plantado, cada vez mais despido de folhagem e pétalas de flores, não estivessemos no outono da nossa vida pátria. Por um lado mantém-se o ortodoxismo comunista, sempre reverente aos comunismos de Estado com tudo o que isso tem de genético e de degenerescência de princípios democráticos (com pena minha); por outro a "nossa" "ortodoxa" igreja católica apostólica romana, sempre tão temente ao poder, quando este lhe é próximo e lhe dá abébias.
Recordam-se como o setor clerical e beato português aclamou os reverendíssimos Cavaco Silva e Passos Coelho e os entronizou no seu poder, aquando da cerimónia de inauguração do patriarcado de D. Manuel Clemente? Tão bela demonstração de proximidade nos afetos e nos intentos, tão reservado afastamento, para lá dos muros de defesa das espessas paredes dos Jerónimos.
Não é de estranhar portanto, o silêncio da igreja nacional às palavras de Papa Francisco, a propósito da pobreza, da exploração do Homem pelo homem, do endeusamento dos mercados e da financeirização, dos riscos da desumanização e do regresso à violência. Salvo raras e honrosas exceções, sempre assim agiu estrutura da igreja católica em Portugal, quando em causa estavam os grandes valores da Democracia e da Liberdade. Sem nada a dizer que não sejam palavras cúmplices do poder obscurantista, é já visível o incomodo do "descontrolo" das palavras de Francisco. Vaticino um "cisma".