A democracia formal não é baseada apenas em eleições e liberdade de expressão. Envolve todo um conjunto de instituições e práticas que reflectem a ideologia dominante, as ideias hegemónicas e a sua linguagem. Neste sentido, a comunicação social é por excelência um dos seus veículos. Não há como negar o papel fulcral dos media na emanação de poder e na formação da opinião pública, especialmente a televisão. A superestrutura também é feita pelos comentários de domingo à noite.
A contratação de José Sócrates para um comentário semanal na RTP levantou inúmeras questões. Várias com raízes partidárias, demagógicas e populistas camufladas de indignação como se os meus impostos também não pagassem o salário de Dias Loureiro, conselheiro económico do Governo, ou também não fosse dado tempo de antena a antigos governantes que deixaram saudades apenas ao seu círculo de companheiros e companheiras. Da minha parte preocupa-me o critério da representatividade que não tem transposição dos votos para o pequeno ecrã. O arco da governação continua o opinion-making habitual sem qualquer respeito pelos eleitores e eleitoras dos restantes partidos, aspecto facilmente visível em período de campanha eleitoral.
As disputas por este aparelho ideológico ocorrem no centro e à direita, o espectro do poder económico, financeiro e político. A esquerda está sub-representada e limitada na sua capacidade de influenciar o sentido do voto e a consciência daqueles que participam politicamente. Continuaremos a ser atingidos verbalmente por conceitos como capital humano, os mercados ou o crescimento negativo da economia na boca de Camilo Lourenço, Marcelo Rebelo de Sousa e outros sem que da nossa parte possa haver resposta. A saída de Alfredo Barroso da Sic Notícias foi disso exemplo.
A democracia é do povo, segundo dizem. Este deveria então sentir-se representado politicamente nos canais que formam a nossa opinião política e, consequentemente, a nossa idiossincrasia. Em vez disso assistimos a uma marginalização dos pequenos partidos e a uma tentativa de silenciamento dos que pretendem contrariar, pela via contra-hegemónica, as ideias que apoiam o modelo socioeconómico vigente.