Segunda-feira, 29 de Abril de 2013

 

As datas que assinalam conquistas laborais em Portugal foram intervaladas pelo XIX Congresso do Partido Socialista. Um Congresso ganho à partida por António José Seguro com a sua aproximação a dois notáveis que desafiaram a sua liderança num passado recente, refiro-me a António Costa e Francisco Assis. Reunido o aparelho, bem visível na lista apresentada à Comissão Nacional, procedeu-se à aprovação da moção "Novo Rumo". Como disse o reeleito secretário-geral, quem esperava um PS radical, irresponsável e facilitista enganou-se. Pelos vistos também se enganou quem perspectivava pelo menos um PS mais arguto, ousado e desafiante do status quo europeu. Uma organização política que se disponibilizasse a uma solução coligada à esquerda para o problema da dívida e procurasse alianças no quadro europeu dos países alvo de intervenção. Nem uma coisa nem outra. Pior, nem uma demonstração de solidariedade. Se o objectivo era não prometer nada que não pudesse cumprir, então a lista vencedora foi mais longe. Não apresentou alternativas substanciais ao problema da dívida portuguesa e à política económica que tanto desemprego e miséria têm gerado.

Com uma dívida pública a situar-se na casa dos 123% com tendência para aumentar, um desemprego galopante e uma economia em queda livre, a nova moção não conseguiu ir além de uma renegociação dos juros e extensão de prazos para cumprimento do défice, além de um papel mais interventivo do BCE como grande estratégia para a recuperação do país. Não conseguiu explicar como resolverá o problema do stock da sua dívida acrescentado aos 78 mil milhões mais juros a pagar à Troika e o seu exercício religioso, qual auto de fé no papel interventivo do BCE. Não existe, portanto, uma solução alternativa que dependa unilateralmente de um governo eleito. Fica por saber como é que António José Seguro evitará o corte nas funções sociais do Estado exigido pela Troika sem rasgar o memorando de entendimento, já que um papel mais acutilante do Banco Central Europeu na compra de dívida depende do compromisso com a intervenção externa, condição sine qua non para compra ilimitada de dívida no âmbito do Outright Monetary Transactions. A própria mutualização da dívida pública portuguesa que exceda os 60% depende mais da correlação de forças na europa, sendo certo que o ministro alemão das finanças Wolfgang Schäuble, pelas suas posições anteriores, demonstra ser um opositor  desta medida. 

Esta é a base para uma folga orçamental que, juntamente com a redução do rácio de solvabilidade dos bancos e a criação de um banco de fomento, possibilitaria uma estratégia fiscal para as empresas, sem sequer mencionar qualquer medida para aumentar a procura. É que a criação de emprego nada diz em relação aos míseros salários pagos, à perda de direitos laborais e o assalto aos rendimentos dos trabalhadores para pagar a dívida portuguesa. Sobre o salário mínimo português nem uma palavra. 

Sem que partilhe das posições da esquerda parlamentar e, como disse Seguro, prossiga a austeridade, ficam várias questões por responder: como é que o PS vai evitar o desmantelamento do estado-social sem, no mínimo, reestruturação da dívida e abandono das políticas de ajustamento e metas do Tratado Orçamental Europeu em relação à dívida pública e ao défice estrutural? De que forma pretende entender-se à esquerda sem que prescinda da estratégia europeia seguida até aqui? Certamente e paradoxalmente com entendimentos à direita. A mesma direita que considerou as medidas apresentadas como demagógicas e irrealistas.

Para uns, o Congresso da unidade e esperança; para outros, como eu, a certeza de que este Partido Socialista não está virado para as pessoas, mas para a austeridade eterna. Não está virado para o país mas para a actual realidade europeia. Um PS virado, isso sim, para uma alternativa que mantenha os cidadãos e cidadãs a financiar o fim do modelo social europeu.





publicado por Frederico Aleixo às 10:39 | link do post | comentar

Catarina Castanheira

Fábio Serranito

Frederico Aleixo

Frederico Bessa Cardoso

Gabriel Carvalho

Gonçalo Clemente Silva

João Moreira de Campos

Pedro Silveira

Rui Moreira

posts recentes

Regresso ao Futuro

Entre 'o tudo e o nada' n...

Le Portugal a vol d'oisea...

Recentrar (e simplificar)...

Ser ou não ser legítimo, ...

O PS não deve aliar-se à ...

(Pelo menos) cinco (irrit...

Neon-liberais de pacotilh...

Piketty dá-nos em que pen...

Ideias de certa forma sub...

arquivos

Junho 2017

Janeiro 2016

Outubro 2015

Abril 2015

Março 2015

Fevereiro 2015

Janeiro 2015

Dezembro 2014

Novembro 2014

Outubro 2014

Setembro 2014

Agosto 2014

Julho 2014

Junho 2014

Maio 2014

Abril 2014

Março 2014

Fevereiro 2014

Janeiro 2014

Dezembro 2013

Novembro 2013

Outubro 2013

Setembro 2013

Agosto 2013

Julho 2013

Junho 2013

Maio 2013

Abril 2013

Março 2013

Fevereiro 2013

Janeiro 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012