Os povos começam a despertar de acordo com os acontecimentos que têm ocorrido na Turquia e no Brasil, principalmente. As manifestações multiplicam-se um pouco por todo o mundo e as reivindicações acabam sempre, umas vezes mais frontalmente que outras, por esbarrar no paradigma económico dominante e vigente um pouco por todo o mundo. Se em Instambul um protesto contra a especulação imobiliária reflectida no empreendimento a ser efectuado na Praça Taksim acabou por arremessar outras questões de foro económico e social; no Brasil a exigência de uma redução no preço da tarifa de autocarro também inverteu a agenda política e conseguiu introduzir a temática dos serviços públicos e do investimento nos sectores da educação e saúde no discurso de Dilma. Mas se os cidadãos e cidadãs acordaram freneticamente, os regimes contra os quais se rebelaram nunca adormeceram. Pelo contrário, os seus mecanismos repressivos têm vindo a fortalecer-se. Na verdade, os dispositivos de segurança pública interna são os últimos bastiões de resistência da cúpula. As forças de segurança que deveriam primar pela defesa da lei são inúmeras vezes manietadas para oprimir e esmagar qualquer foco de instabilidade. Em vários países é possível assistir a uma tentativa de alterar as regras do jogo, deturpar a separação de poderes e criar um clima de perseguição em nome da ordem social.
No Brasil não passou incólume a hipotética aprovação do PEC 37 que inclusivamente foi adiada devido à voz das ruas. Uma proposta de emenda à Constituição brasileira que permitiria entregar o monopólio das investigações criminais à polícia, retirando qualquer poder ao Ministério Público nesse campo. Se juntarmos a este facto a violência das forças policiais nos confrontos com os manifestantes, tendo resultado em vários feridos e dois mortos até ao momento, verificamos o perigo que esta proposta poderá representar. A própria Dilma deixou impune a acção perpetrada pela polícia nas ruas na sua declaração ao país, atribuindo o ónus da culpa a uns poucos "vândalos".
A situação turca foi bastante mais visível e explícita. O recurso a torturas e detenções arbitrárias para não falar no uso de armas químicas alertou o mundo para os limites da democracia turca no ponto de vista de Erdogan. Para já as manifestações foram proibidas na Praça Taksim e as responsabilidades da escalada de tensão entre as forças envolvidas foram atribuídas à imprensa internacional e às redes sociais. O próprio primeiro-ministro turco já afirmou que tenciona censurar sites como o facebook e o twitter. Como sempre o papel de criminoso foi reservados para aqueles e aquelas que quiseram fazer valer o seu ponto de vista sobre a situação vivida no país.
Em terras portuguesas não devemos esmorecer com qualquer tentativa de desincentivar a exteriorização da nossa insatisfação. A maneira como a Troika e os seus capatazes chantageiam os cidadãos e cidadãs com o medo que é alimentado pela precarização laboral ou perda de direitos sociais e económicos ou com a ameaça de legislar de forma a condiciar as várias formas de luta deve, pelo contrário, trazer a população à rua. O Governo tem receio do que aí vem e providenciou o aumento da verba orçamental do Ministério da Administração Interna, as multas avultadas para a prática de graffitis ou a criação de uma comissão instaladora que em 2012 ficou responsável pela instalação de um Centro Nacional de Cibersegurança. Mas não é o povo que deve temê-lo, é o governo que deve temer-nos.