Ao contrário de muitos, sempre reconheci a Seguro uma enorme capacidade política. Recordo-me perfeitamente de o ver em 2004, no arranque da campanha para as Europeias que o PS venceria com 44%, a arrebatar toda uma audiência com um discurso mobilizador. Não me surpreende, por isso, ver o Seguro que tenho visto nos últimos dois meses, em campanha interna. Surpreendeu-me sim ver um Seguro completamente diferente durante três anos à frente do PS.
Já me têm dito, desde o início da campanha interna, coisas como “picaram-no, agora aguentem-se”; caramba, então é preciso ameaçarem-lhe o lugar que considerava garantido para que ele ganhe vida? A defesa dos valores do PS, a oposição a esta política, a defesa dos direitos sociais e da vida dos Cidadãos da República não é motivação suficiente?
Afrontaram-no e isso irritou-o, compreendo. Mas os cortes de salários não o irritaram? O desemprego não o irritou? O ataque à escola pública, à segurança social e ao SNS não o irritaram? Qual é efectivamente o seu objectivo, mudar o país, derrotar esta política, ou ‘apenas’ ser Primeiro-Ministro?
Não consigo compreender um líder político que é mais duro, mais agressivo, contra a sua oposição interna (que é legítima num partido democrático, porque, apesar de agora não podermos destituir o líder do PS, isto ainda não é o PCP nem a Coreia do Norte) do que é contra aqueles que, supõe-se, estão a impor ao país uma política com a qual discorda. Não aceito um Secretário-Geral que se insurgiu mais violentamente contra os supostos ‘interesses’ existentes no PS do que contra todos os negócios opacos de Miguel Relvas, Dias Loureiro e tantos outros. Não é só, não pode ser, porque Miguel Relvas seja um amigo de largos anos e Costa um adversário de sempre.
Seguro defende que se anulou para assegurar a paz interna. Mas, se a sua suposta oposição interna é a que sempre reclamou uma atitude mais agressiva para com o Governo, como pode isso justificar tanta passividade? Na minha opinião, uma das razões fundamentais é que Seguro esperava que isto fosse um passeio. Habituado desde sempre a gerir a sua carreira nos cânones habituais da política lusitana, Seguro esperava que o poder lhe caísse ao colo sem grande esforço e sem grandes compromissos, ignorando que isto não é uma carreira e os tempos que correm são tempos de audácia, de convicções e de luta.
Mas há mais uma coisa que seguro diz, e essa eu também acho que foi uma razão fundamental: Seguro entendeu que tinha de fazer uma oposição ‘responsável’. Na procura dessa responsabilidade, Seguro abdicou de pôr em causa (ou então nunca sequer quis) todo o consenso neoliberal existente em Portugal e na Europa, impedindo qualquer efectiva distinção de fundo entre o PS e a direita. Para mim esse é o seu fundamental problema e, por essa razão, ele contaria sempre com a minha oposição interna, ainda que os resultados eleitorais fossem bons, que não foram. Sobre a posição ideológica de Seguro, e a minha oposição a ela, conto escrever ainda até amanhã. Mas há uma coisa que tenho de referir agora: a ânsia de Seguro se distanciar de Sócrates.
A imagem pública de José Sócrates, depois de sair do governo e tendo assinado o memorando de entendimento, deu a seguro a razão perfeita para procurar distanciar-se dele, coisa que quereria sempre fazer dada a rivalidade entre ambos. Ora, fazendo isto, Seguro abdicou de contrariar, durante quase três anos, a tese da direita sobre a origem da crise, impedindo-o de efectivamente apresentar uma visão alternativa.
Nisto eu não conseguirei ser mais claro do que o (insuspeito em matérias de Sócrates) Daniel Oliveira já foi, aconselho-vos a ouvir: